Cuidados Excepcionais
Antoninho, ao contrair sarampo, sua primeira moléstia, deu exemplo de muita resignação. Dir-se-ia que sua alma, numa intuição sobrenatural, discernira toda a extensão das amarguras por que teriam de passar ele e seus pais. Explica-se, por isso, o cuidado que demonstrou como se já soubesse avaliar as conseqüências decorrentes dessa doença eruptiva e que exige o necessário isolamento. Por isso não apertava a mão de ninguém, mesmo depois de haverem passado as fases dessa moléstia e o período da descamação. Os pratos, copos, talheres e guardanapos, ele os exigia separados. Às refeições reclamava sempre que estendessem um guardanapo grande sobre a toalha, onde ele dispunha com suas próprias mãos os arranjos da mesa. Assim procedia também na hora do lanche. Ao lhe apetecer uma fatia de pão ou qualquer guloseima, não as retirava, pedindo que as pusessem sobre a toalha. Seus pais esclareciam não haver necessidade de tamanhas precauções, pois o próprio clínico afirmava explicitamente não ser motivo para apreensões, visto ser uma moléstia que não precisava de médico, uma vez que não aparecera nenhuma das afecções consecutivas.
Restabelecido do sarampo, a febre mostrou-se, entretanto, renitente, pelo que o facultativo aplicou-lhe uma injeção aconselhando que transferissem o doente para Santos, onde ele com uso dos benéficos banhos de sol, havia de voltar com saúde.
Esse foi o primeiro equivoco, como veremos;
Em Santos manifesta-se em Antoninho uma moléstia em sua forma mais comum, que afeta os indivíduos de quaisquer idade: - a pleuris seca que não fora, infelizmente, diagnosticada senão posteriormente e já muito tarde. Deixando Santos, onde estivera em casa de um parente, e voltando para São Paulo, Antoninho submeteu-se a um novo exame, sendo-lhe diagnosticado sofrer do coração. Em face desse novo quadro clínico, patente aos olhos e ouvidos profissionais, recebe o nosso menino o tratamento preconizado.
Segundo e lastimável engano;
Tudo isso, senão razoável, enquadrava-se à vontade divina onisciente, que deste modo ia preparando para a escalada dos céus, onde se ascende com o sofrimento, aquela alma querida.
De São Paulo, transfere-se Antoninho para São Roque e, subsequentemente, para Campos do Jordão “por se achar somente enfraquecido”.
Nessa ótima e alterosa estação climática, onde tantas naturezas se refazem, é que a único doença, insidiosa por si mesma e desorientadora pelos seus sintomas, devia apresentar-se sobre o seu positivo e terrível quadro clínico, não oferecendo mais controvérsia nem dúvida possível! Antoninho estava tuberculoso! Os ruídos de sua respiração estertorosa e a percussão reveladora a ninguém mais enganava!
Antes de Antoninho seguir para Campos do Jordão, quando ainda ninguém suspeitava do seu verdadeiro estado, pois nem mesmo o médico dele se capacitara, chamou particularmente sua avó para uma explicação. Sua mãe, cheia de cuidados e apreensiva, observou-o :
“Com efeito, meu filho, que falta de confiança para com sua mãe!”
Ele, cheio de ternura respondeu : “Minha mãe, não é nada que a senhora não possa saber, mas eu queria conversar só com a vovó”.
Então disse : “Minha avó, amanha irei para Campos do Jordão como a senhora sabe. Queria que queimassem meu colchão e também tudo que é meu. Depois disso a senhora arranjará uma porção de brasas e queimará bastante enxofre, fechando meu quarto por alguns dias”.
A boa senhora achou extravagantes esses cuidados, unicamente por partir de uma criança! Se fosse uma pessoa adulta, seriam ponderados, mesmo que ainda estivesse diagnosticada sua verdadeira moléstia.
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